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“E aos que não sabem, ou esqueceram, nunca é demais recordar.”

Rodrigo da Silva, editor do Spotniks, publicou hoje, no seu Facebook, o seguinte texto:

Ele seria visto hoje como um coxinha. Dentista, de classe média, sonegador, desses que batem panela reclamando da carga tributária vestido de verde e amarelo.
Mas entrou para a história como um mártir. Um dos nossos pais fundadores. Herói nacional. Um líder revolucionário do liberalismo, assassinado pelo Estado.
E aos que não sabem, ou esqueceram, nunca é demais recordar.
Há exatos 225 anos, nessa mesma data, em solo carioca, Tiradentes acordou aprisionado à Cadeia Velha. De lá, saiu em direção à Praça da Lampadosa, perto do meio dia, a caminho dos livros de História, ao subir 21 degraus da forca onde cumpriria a sentença de morte pelo crime de lesa-majestade. Era magro, alto e não possuía um único fiapo de barba – ao contrário do que nos contam as pinturas.
Caso posto numa máquina do tempo, Tiradentes muito provavelmente não entenderia o que raios acontece na terra onde clamou por independência.
De volta à vida, ele descobriria que a sua cadeia é o atual Palácio Tiradentes, sede da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, onde alguns dos maiores bandidos da nossa era permanecem ganhando a vida assaltando o bolso dos pagadores de impostos.
Caso estivesse realmente interessado no assunto, Tiradentes também descobriria que nem a Lampadosa, onde despejou sua última gota de sangue, conseguiu escapar ilesa das ações perdulárias da organização que lhe condenou à eternidade. Reformada há pouco tempo, a praça que hoje recebe o seu nome, no centro do Rio, foi revitalizada aos custos astronômicos de 3,5 milhões de reais, em obras capitaneadas por uma estatal que hoje ganha as manchetes envolvida em escândalos de corrupção.
Com a televisão ligada, nosso herói nacional assistiria atônito aos substitutos dos agentes públicos que um dia lhe arrancaram a cabeça e esquartejaram o seu corpo em quatro partes, confessando o caos. E eis o mistério da fé: sem gerar qualquer revolução.
Em pouco tempo, Tiradentes perceberia que não apenas os seus compatriotas pagam agora o dobro do que lhe era confiscado pela Coroa portuguesa, como também são obrigados a conviver com escândalos em cada obra pública, em cada canto do país. Mais do que isso: ele descobriria que todos aqueles que agora levantam as suas mesmas bandeiras liberais, clamando por independência, continuam sendo acusados de anti-heróis, inimigos do povo, por uma classe de intelectuais pelegos e burocratas autoproclamados progressistas, que não pensariam duas vezes antes de condenar figuras como ele ao enforcamento público, caso isso fosse possível.
“Nada nesse país parece fazer o menor sentido”, ele diria. E não sem razão.
A sua luta não valeu a pena. A sua cabeça foi arrancada à toa. Eis o resultado: 153 dias de trabalho no ano apenas para pagar impostos. Mais do que em qualquer outro momento da nossa história.
Mas hoje, desencane. Não se preocupe com o pijama, jogue fora o despertador. Graças a esse homem é feriado. E você pode ser coxinha ou mortadela, da favela ou do asfalto, a essa altura do jogo não faz a menor diferença – à vasta maioria das pessoas, embriagadas por uma distopia em verde e amarelo, essa é a única coisa que importa de verdade.
– Rodrigo da Silva, editor do Spotniks

Fonte: Rodrigo da Silva.

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